Operação Venefica: substâncias ‘perigosas’ são omitidas de bulas de medicamentos; veja quais

Sibutramina, anabolizantes, anfetaminas e hormônios. Estas são as principais substâncias misturadas nos medicamentos fornecidos pelas clínicas de emagrecimento investigadas na Operação Venefica. A maioria delas só pode ser vendida com receita e precisa de acompanhamento médico para uso, regras ignoradas pelos estabelecimentos acusados de compor a organização criminosa.

Componentes de compostos vendidos eram adulterados pelos profissionais que participavam do esquema criminoso – Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Segundo denúncia do MPSC (Ministério Público), Felipe Francisco, mentor do esquema criminoso, era o responsável por criar  “protocolos”, ou seja, “compostos medicamentosos voltados para o emagrecimento, ganho de massa magra, aumento de músculos, performance física, entre outros”, com substâncias de venda proibida sem receita.

Felipe, porém, não tem formação médica para receitar este tipo de medicamento. Por isso, contratava médicos que apenas assinavam as receitas, sem consulta prévia de pacientes ou análise do histórico de saúde.

Além disso, conforme denúncia dos próprios pacientes, as substâncias usadas nas medicações não eram informadas, portanto, as pessoas não sabiam o que estava consumindo.

De acordo com o MPSC, em uma das composições, o uso da sibutramina foi omitido do rótulo, sendo misturada, inclusive, com venvanse/lisdexanfetamina, substância psicotrópica derivada da anfetamina e usada pelas clínicas em seus compostos.

O médico psicofarmacologista, especialista em tratamento de dependentes químicos e professor na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) Tadeu Lemos destaca que essas substâncias causam dependência, possuem efeitos sobre os sistemas hepático, cardiovascular, reprodutor, neuroendócrino e não podem ser usados em conjunto.

Veja lista de substâncias encontradas nos medicamentos, segundo denúncia do MPSC:

Sibutramina: medicamento indicado para tratamento de obesidade. Ela atua no sistema nervoso central e causa efeito de saciedade. Conforme Lemos, a sibutramina é semelhante à anfetamina, mas com efeito de dependência menor.

Venvanse/lisdexanfetamina: também usado no emagrecimento e com atuação no sistema nervoso central. Segundo denúncia do MPSC, a substância psicotrópica de uso medicinal derivada da anfetamina

Durateston (testosterona), oxandrolona e somatropina: os dois primeiros são hormônios masculinos. Conforme o MPSC, são substâncias anabolizantes de uso controlado. A médica especialista em endocrinologia Tanise Damas (CRM 10980) afirma que a somatropina é um hormônio do crescimento, usado principalmente em crianças, e em alguns casos em adultos com deficiência neste hormônio.

Liotironina (hormônio T3), T4-tiroxina e T3 triiodotironina: hormônios tireoidianos, estes podem ser vendidos sem receita médica.

Efeitos e perigos

Resumidamente, Lemos cita que todas essas substâncias podem ser usadas no processo emagrecedor, mas ele reforça que, para o uso de qualquer uma delas, é necessário que o paciente passe por exames de avaliação médica contínua.

“Não vai tomar e não aparecer para a avaliação. São medicamentos que precisam de reavaliação contínua, até pelo risco de dependência”, cita Lemos. Além disso, há também os efeitos colaterais, que precisam ser avaliados por médicos.

A endocrinologista também afirma que as medicações podem ser benéficas, desde que o uso seja feito a partir de acompanhamento médico e de acordo com as indicações. “Mas há riscos se associar as medicações a outras”, destaca Tanise.

Cliente descreve sintomas e efeitos colaterais – Foto: Reprodução/MPSC/ND

De acordo com Lemos, fazem parte dos efeitos colaterais adversos dessas medicações: náuseas, vômitos, problemas gástricos e temperatura corporal.

O uso indiscriminado dessas substâncias, principalmente anabolizantes que são tóxicos para o fígado, pode causar quadro de doenças renais, inclusive câncer, cita o especialista. “Desregula o funcionamento cardíaco, causa crise de hipertensão, hipertrofia da musculatura cardíaca e favorece a criação de coágulos, favorecendo o infarto”, conta.

Tanise cita que, no caso da somatropina, por exemplo, o uso fora da indicação médica correta aumenta o risco de aumento das extremidades e desenvolvimento de cânceres.

 

Os hormônios tiroidianos, apesar de serem vendidos sem receita, também podem causar problemas futuros caso tenham uso indiscriminado. “Tem indicação para tratar o hipotiroidismo, quando é usado fora disso tem risco de arritmia, palpitação e até AVC”, comenta a especialista.

Além dos efeitos causados pelos próprios medicamentos, também há os sintomas de abstinência, efeitos da dependência química das substâncias, como ansiedade, agressividade e mudanças de humor.

Por esses motivos, Tadeu destaca a necessidade de acompanhamento médico durante todo o tratamento, protocolo que não é seguido pelas clínicas de emagrecimento denunciadas no processo, já que as medicações eram receitadas sem devida consulta ou avaliação médica.

Inclusive, Felipe é acusado no processo por falsidades ideológicas, e exercício ilegal da medicina, além de compor organização criminosa, agindo na venda, depósitos e entregas a consumo de produtos destinados a fins terapêuticos e medicinais, lavagem de capitais, dentre outros, cita a denúncia do MPSC.

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